segunda-feira, 29 de agosto de 2016

A Terra mais próxima (meu artigo no último Sol)


O físico inglês Isaac Newton escreveu em jeito de conclusão na sua monumental obra “Princípios Matemáticos de Filosofia Natural, publicada em 1687 (há tradução portuguesa da Fundação Calouste Gulbenkian):
“Este muito belo sistema do Sol, planetas e cometas só poderia provir do desígnio e domínio de um Ser inteligente e poderoso. E se as estrelas fixas forem centros de sistemas semelhantes todos eles forem formados segundo u, desígnio semelhante e sujeitos ao domínio desse Ser, especialmente porque a luz das estrelas fixas é da mesma natureza da luz solar e todos os sistemas enviam luz uns aos outros. E para evitar que os sistemas de estrelas fixas, pela gravitação, caíssem uns sobre os outros, Ele colocou-os a imensas distâncias uns dos outros.
Newton não foi o primeiro a falar de outros sistemas solares semelhantes ao nosso. Em 1600 foi queimado numa fogueira em Roma, condenado pela Inquisição, o filósofo italiano Giordano Bruno, que tinha escrito no seu livro “Do Universo e dos mundos. Acerca do infinito (de 1584; também há tradução na Gulbenkian):
“Por isso é necessário investigar se existe, além do céu, Espaço, Vazio ou Tempo. Pois há um único espaço geral, uma única vasta imensidão quais podemos livremente chamar Vazio; nela existem inumeráveis globos como este em que vivemos e crescemos. Declaramos que o espaço é infinito, uma vez que nem a razão, conveniência, possibilidade, senso-comum ou a natureza lhe atribui um limite. Nele há uma infinidade de mundos do mesmo género que o nosso.
Hoje conhecem-se mais de 3500 planetas extrasolares, isto é, planetas que circulam em volta de outros sois. Parece que os sistemas planetários são bastante comuns no nosso Universo, pelo menos na nossa Galáxia. O maior foco de atenção a possibilidade de existência neles de planetas semelhantes à Terra, isto é, com condições favoráveis ao desenvolvimento de vida. Existe cerca de uma dúzia desses planetas.

Mas há novas notícias dos céus. A 24 de Agosto de 2016 uma equipa de astrónomos do Observatório Europeu do Sul anunciou, através de um artigo na revista “Nature, a descoberta do exoplaneta mais próximo de nós, pois orbita a estrela mais próxima de nós, denominada precisamente Próxima do Centauro

Este outro sol, classificado pelos astrofísicos como “anã vermelha” e elemento de um sistema de três estrelas, não está fixa uma vez que todas as estrelas se movem: está actualmente a 4,2 anos-luz da Terra (o ano-luz é a distância que a luz percorre durante um ano) e dirige-se para o Sol. Dentro de milhares de anos estará ainda mais próxima...

estrela diz-se anã porque a sua massa é cerca de um décimo da massa do Sol. planeta em seu redor, que foi baptizado “Proxima Centauri b”, tem uma massa que é, pelo menos, 27% maior que amassa da Terra. E está a uma distância que é 5% da distância da Terra ao Sol, quer dizer, está muito próxima da Próxima do Centauro. Falta confirmar estas primeiras observações, como mandam as regras das boa ciência, mas, a crer nos resultados publicados, a  terra mais próxima poderia ter água à superfície e atmosfera. Isso não quer evidentemente dizer que tenha vida. E, se tiver vida, também não é certo que se trate de vida semelhante aquela que conhecemos na Terra, baseada no ADN.

Como nada disto é certo, aqui estão óptimas questões para investigar. As intuições de Newton e de Bruno sobre a existência de outras terras revelou-se certa. Mas eles não pensaram que esses planetas pudessem albergar vida. Nós não só pensámos como estamos a tentar verificar se esse pensamento está certo.

Há, claro, uma outra questão, uma grande questão, na mente de todos, cientistas ou não. Será possível ir de Terra a terra? Será possível uma viagem de uma sonda da nossa Terra até à mais próxima? Não é impossível, mas sim extremamente difícil usando tecnologia corrente.

A sonda Voyager 1, que foi lançada há 39 anos e que já saiu do sistema solar (está a 18 horas-luz da Terra), vai a “passo de caracol” em comparação com a velocidade da luz. Viaja a cerca de 62.000 quilómetros por hora, o que não é nada comparado com os 300.000 quilómetros por segundo da luz. Não vai em direcção à Próxima do Centauro, mas se fosse demoraria dezenas de milhares de anos a lá chegar. Uma nave que viajasse a um décimo da velocidade da luz demoraria 42 anos a lá chegar.

Há quem sonhe que, com novos sistemas de propulsão, seja possível que um objecto arremessado do terceiro planeta do sistema solar chegue ao sistema planetário mais próximo nesse tempo ou porventura em menos.

Habitamos um pequeno planeta à volta de uma estrela média numa galáxia banal. Mas somos uma espécie curiosa que não só já conhece a sua vizinhança espreitando-a como sonha em viajar até até lá... 

2 comentários:

João Alves disse...

Da leitura do texto pode ficar a ideia de que Giordano Bruno foi condenado pela Inquisição e morto por defender as teses do universo infinito e a pluralidade dos mundos, quando na verdade a sua condenação deve-se a questões de ordem teológica sobre a divindade de Cristo, transubstanciação, panteísmo, etc. e não pelas teorias científicas.

Carlos Fiolhais disse...

Caro João Alves
É verdade o que diz sobre a condenação de Bruno. Mas do meu texto não decorre necessariamente que ele foi condenado pelas suas teses dos "muitos mundos". Com a sua nota fica esclarecido.
Cordialmente
Carlos Fiolhais

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